quarta-feira, 9 de março de 2016

Não se faz amigos bebendo leite


09 de março de 2016

Esta frase ouvi muito nos tempos de academia com a finalidade de justificar a bebida. E, de fato, todo mundo fica mais solícito a ser amigo quando bebe e quando bebe muito acontece até de amar outrem para caramba, para ser humilde no advérbio. Mas, desta vez, fiz amizades na fila do supermercado antes de beber, pelo simples fato de ter adquirido a bebida.

Estava a pesquisar um número de palhaço, onde tento beber algo que não leite (isso está nas entrelinhas da cena, pode ser leite se a sua mente quiser) sem as mãos. Testei e treinei o número algumas vezes, mas com uma garrafa de água plástica. Pensei que para a bebida estar nas entrelinhas, eu precisava daquela tradicional tampa amarela na garrafa, indicando qual o líquido que ali estaria. Porém, precisava que a garrafa fosse de plástico, para facilitar o manuseio que na verdade não é manuseio porque não usaria as mãos. Seria tarefa fácil se estivesse na Bird’s em Pinhalão/PR, pois lá já ouvi dizer ter garrafa de Telecoteco de plástico.

Acontece que procurei em bairros, bares, mercadinhos menores, até que desisti e fui para um mercado grande daqui de Londrina. Não encontrei nada com a tradicional tampa amarela que fosse de plástico, e resolvi comprar a de vidro mesmo. Não adianta nada ter irmã dentista se não posso arriscar um ou dois dentes treinando um número com garrafa de vidro.

Acontece que em direção ao caixa rápido do mercado em questão, com somente aquela garrafa em mãos, fui interpelado por dois ébrios habituais que, ao me verem com aquela garrafa somente, e ao verem que eles também só tinham uma garrafa de pinga nas mãos, disseram, “esse é dos nossos”! Sem seleção prévia, sem cadastro, sem comprovante de residência e muito menos sem pagar anuidade fui rapidamente aceito para o clã de pessoas que tomam pinga quente numa quarta-feira à tarde, muito embora eu ainda não tivesse explicado minhas intenções para o líquido. Lembrando que até o momento minhas intenções eram somente com a garrafa (se eu soubesse o resultado do jogo do São Paulo daquele dia possivelmente essa história seria diferente).

Papo vai, papo vem, meu mais novo amigo me pergunta, “você vai beber isso aí?”, ao passo que respondo que não, que meu interesse é pela garrafa para fazer um número de palhaço. Vi nos olhos dele que passaram a olhar estupefatos para mim com a ideia a nascer em sua mente tomando corpo e coragem e lhe enchendo o peito de alegria e finalmente dizendo: “cara, você não me daria o líquido?”. Como e por que negaria nesta hora?

E foi assim, que vi um belo ato de ética e de consumo racional, quando meu amigo devolveu o dinheiro que havia arrecadado ali mesmo no mercado para quem tinha ofertado, e devolveu a garrafa ao mercado, e saiu em disparada atrás de algum vasilhame e achou os vasilhames. Foi assim que todo o mercado ficou me repreendendo com o olhar enquanto dividia o líquido que eu não usaria com pessoas que fizeram uso naquele mesmo minuto. Foi assim que fiz dois amigos da Avenida Tiradentes que, ainda por cima, disseram-me para não mais comprar pinga só por conta da garrafa, porque garrafa vazia eles tem de monte é só eu buscar.

Fiz amigos, ainda que efêmeros, e nem bebi.

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